terça-feira, 27 de setembro de 2011

MOÇAMBICANOS APUPARAM AS SELECÇÕES ANGOLANAS

Por: Belarmino Van-Dúnem

Angola é o Estado dos PALOP que mais tem sobressaído no desporto. Mas também destaca-se no continente africano por dominar algumas modalidades, tais como o Basquetebol; Andebol Feminino; Hóquei em Patins; Boxe Profissional; desporto Para-olímpico; no futebol apesar de não ser a potencia que se esperava, mas é a único dos PALOP que conseguiu a proeza de participar numa fase final do campeonato do mundo. Nós angolanos, sabemos a paixão que temos pelo desporto e por tudo o que envolve o nome do país. Ainda esta semana, acordamos boquiabertos com a eleição da Miss Universo, título atribuído à uma cidadã angolana.
Mas não deixa de ser verdade que o Estado angolano também se destaque por ser solidário com outros Estados e respectivos povos. A relação inter-estatal entre Angola e Moçambique remontam aos tempos da luta contra o jugo colonial, mas os laços de amizade se aprofundaram com a formação do Grupo dos Países da Linha da Frente; a SADCC e posteriormente com a actual SADC. Existem vários Acordos e Protocolos nas mais diversas áreas que os dois países subscreveram, inclusive existem laços sociais e culturais entre os dois povos. Muitos moçambicanos vivem em Angola, formaram famílias e no outro lado do indico também conheço alguns angolanos que decidiram viver em Moçambique e por lá estão felizes da vida. Alias, esta ligação umbilical já vem de outras primaveras, por exemplo, o maior ídolo do futebol português e grande referência moçambicana, Eusébio tem uma costela angolana, portanto há um conjunto de condicionantes favoráveis para uma boa relação entre os dois povos.
Por várias ocasiões viajei para Moçambique, tendo ficado na simpática cidade de Maputo. A impressão com que fiquei é de uma boa convivência, um povo humilde, simpático, acolhedor e trabalhador. As pessoas com quem tive oportunidade de conviver sempre fizeram boas referências de Angola, embora reclamassem alguns excessos cometidos por compatriotas nossos. Mas se alguém procurar excessos praticados por cidadãos quando estão em horas privadas, encontraremos pessoas de todas as nacionalidades. Alguns moçambicanos chegaram a confidenciar que se sentiam um pouco desconfortáveis pela forma como os angolanos exibiam os dólares no bolso e a arrogância como tratavam os cidadãos nacionais moçambicanos nos bares e noutros locais de convívio. Na altura, lembro-me de ter respondido que essa mesma reclamação nós, angolanos, também tínhamos com relação à alguns estrangeiros em Angola.
Mas, o meu espanto está no comportamento dos moçambicanos nos X Jogos Africanos que estão a decorreram em Moçambique. Angola levou uma das maiores comitivas que honrou o evento, mas o entusiasmo e a disponibilidade dos angolanos, tanto dos atletas como das autoridades nacionais não tiveram respaldo junto do povo moçambicano ou, pelo menos, das pessoas que estiveram nos pavilhões a assistir os jogos. Enquanto nós, angolanos, pensávamos que estávamos a jogar em casa, junto de um povo irmão, tudo foi diferente. Os que estavam presente nos pavilhões não conseguiam esconder a aversão que tinham pelas selecções angolanas nas várias modalidades e cada vez que Angola tentava vencer uma partida ouvia-se um “Buruà” ensurdecedor vindo das bancadas, os jogadores eram constantemente apupados.
Eu fiquei estupefacto, embora não acompanhe um jogo de basquetebol até ao fim, acabei por assistir o jogo entre Angola e o Egipto porque sentia que os angolanos estavam a jogar contra duas equipes. A mais forte estava na bancada, uma claque do contra organizada espontaneamente. E, como é evidente, qualquer cidadão acaba por ficar preso ao televisor no desejo de ver os seus compatriotas a ultrapassar aquela adversidade desportiva, no caso a única ajuda é mesmo telever o jogo. No final fiquei satisfeito porque Angola passou para a fase seguinte, mas ouviam-se alguns apupos nas bancadas, mostrando que o público não estava com Angola, aquela vitória teve um simbolismo especial porque foi suada e venceu a melhor equipa, no caso Angola.
Mas ao ligar a TPA numa outra ocasião deparei-me com os analistas para o desporto nacional que, como sabemos são bastante eloquentes e têm sempre sugestões para as diferentes situações que não correm bem no campo. Ao ouvir as preocupações pela forma como a Selecção Nacional Feminina de basquetebol estava a jogar, decidi assistir um pouco e por coincidência era a final, Angola V Senegal. Mais uma vez notei que a bancada estava contra Angola e os apupos eram ainda mais ensurdecedores, causando nervosismo e desorientação as jogadoras nacionais que tentavam honrar a bandeira angolana. Eu fui me contorcendo até ao final do jogo, ao contrário do embate, Angola V Egipto, nessa final tive que encolher os ombros, mas logo comecei a fazer um solilóquio que deu origem a este desabafo que o senhor leitor lê.
Perguntei-me, o que se passa com o povo irmão de Moçambique? Eu sabia que uma boa parte dos moçambicanos expressava-se bem em inglês, mas porque razão estariam a apoiar dois países, um com língua oficial árabe e outro de expressão francesa? Por que razão os nossos jogadores ouviram aqueles “buruàs” quando até temos a mesma língua oficial. Sempre estivemos juntos, agora há apupos, quando deveríamos receber palmas? Que mal fizemos nós?
Bom, o povo apoia quem quer, mas a probabilidade de se dar apoio à quem é mais próximo é muito maior. Nós angolanos somos próximos dos moçambicanos, pelo menos se nos compararmos com os egípcios e com os senegaleses. Então alguma coisa vai mal, há necessidade de reaproximar os dois povos porque a nível institucional me parece que as relações são as melhores. Assim como se apupa no desporto que é uma actividade que desperta a simpatia de qualquer um, poder-se-á encontrar dificuldades noutros domínios da cooperação. Angola e Moçambique devem continuar de mãos dadas, fazendo a concertação nos fóruns multilaterais como na ONU; União Africana; CPLP; PALOP e na SADC. Mas também intensificar a cooperação com base na reciprocidade e nas vantagens comparativas e complementares, sem esquecer o sector da cultura onde parece existir um pequeno vácuo.
Quando se vai a Maputo é fácil encontrar cartazes a publicitar artistas angolanos da nova geração com espectáculos marcados. Aqui, em Angola raras vezes vemos artistas moçambicanos, embora saibamos que o MC Roger; Lízhia James; Ziqo; Stewart Sukuma; Neyma; Dama do Bling e outros artistas moçambicanos fazem o tipo de música que a nova geração gosta e dança e os mais velhos poderão lembrar Fanny Mfumo. A arte moçambicana ganhou um espaço no mundo bastante notável, o artista plástico e pintor Malangatana, o poeta José Craverinha, ambos já falecidos, o escritor Mia Couto e outras facetas da cultura moçambicana poderiam ser mais divulgadas entre nós.
Mas perante o sucedido nos X Jogos africanos urge a elaboração de programa conjunto, Angola/Moçambique para reaproximar os dois povos para o bem da cooperação bilateral, sem o acolhimento dos cidadãos as relações oficiais não fazem sentido. Alias, como diz um provérbio popular moçambicano “a amizade é um caminho que desaparece na areia, se não se pisa constantemente nele”, portanto se não houver um trabalho para que os laços de fraternidade entre os dois povos se mantenham e desenvolvam, o caminho da amizade entre Angola e Moçambique poderá desaparecer. Estou certo que esse não é o desejo dos dois Estados e respectivos povos no geral. Alias, é notório o apreço do povo angolano pelos moçambicanos quando algumas selecções daquele país irmão passam por Angola, mas parece que o recíproco não é verdadeiro.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

OS CULPADOS DA INEXISTÊNCIA DE UM ESTADO PALESTINO

Por: Belarmino Van-Dúnem

A criação de um Estado Palestiniano é um assunto que apaixona e, muitas vezes para não dizer na maioria dos casos, leva as pessoas a fazerem considerações sem a devida pertinência que o caso merece. Se há algum sucesso do povo árabe da Palestina é o de fazer passar para opinião pública internacional uma percepção de vítima, facto que tem feito granjear grandes simpatias e a solidariedade a nível mundial. Mas a análise dos factos históricos mostra que existe relutâncias e radicalismos tanto do lado israelita como por parte dos palestinianos.
O senso comum sabe apenas que os judeus foram colocados naquele território por causa do holocausto perpetrado pelos nazistas e a perspectiva errada diz que foram os Estados Unidos que estiveram na base da escolha do território. Na verdade os factos são totalmente inversos, o Reino Unido do qual não se fala, é o principal responsável histórico do status que existe na Palestina. Mas a pergunta fundamental para se compreender o conflito Israelo-árabe é a seguinte: Porque que os Judeus foram parar naquela região se o holocausto aconteceu na Europa?
A resposta remonta aos tempos bíblicos no velho testamento onde se faz referência aos Hebreus e a história de desintegração do seu reino e respectivo povo que, entre o Êxodo e a reconquista do seu território através do Profeta Moisés. A verdade é que o povo de origem semita acabou por estar disperso por toda a Europa e com uma presença reduzida na região do Médio Oriente. O regresso às origens do ponto de vista geográfico começou no século XIX com o aparecimento do movimento sionista aperfeiçoado e divulgado pelo Judeu Theodor Herzl, cujo fundamento principal era a criação de um Estado soberano judaico na terra das suas origens, onde deveriam viver em conformidade com os seus hábitos e costumes milenares.
Até a derrota da Alemanha na Primeira Guerra a região da Palestina era governada pelos turcos, mas como o império Otomano foi aliado da Alemanha depois da derrota, em 1922, o império e os territórios árabes sob sua tutela foram submetidos ao mandato da Liga das Nações que delegou à França e ao Reino Unido para administra-los. A França governava a Síria e o Líbano e o Reino Unido recebeu toda a região que se situa entre o Rio Jordão e a parte mediterrânea, chegando até a zona da Transjordânia (Joseph S. Nye Jr. 2009:224). A presença dos judeus na região foi aumentando progressivamente e, em Novembro de 1917, os Britânicos divulgaram a Declaração de Balfour, uma carta dirigida à Federação Sionista que afirmava o seguinte: “O Governo de Sua Majestade é favorável ao estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu e fará os maiores esforços para facilitar a realização desse objectivo, sendo claramente entendido que nada deve ser feito que possa prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades não judaicas existentes na Palestina, ou os direitos e a posição política de que os judeus desfrutam em todos os outros países” (Declaração de Balfour, 2 de Novembro de 1917 In: Martin Meredith 2010:346).
A leitura atenta da declaração que acima se transcreve permite chegar a conclusão que houve uma grande ambiguidade. Não clarifica que tipo de lar, quando e a localização geográfica dentro do território que na altura delimitava a Palestina. Mas ficou claro que, independentemente do tipo de “lar Nacional” para os judeus que viesse a ser estabelecido, nada deveria afectar o direito dos povos não judeus instalados na Palestina, assim como os direitos adquiridos de que os judeus desfrutavam em todos outros países não deveriam ser afectados.
Segundo Joseph S. Nye Jr. (2009:257), o ambiente hostil à filosofia sionista na Europa e a pressão feita aos Judeus em alguns Estados, mesmo estando bem inseridos económica e socialmente, incentivou a imigração para Palestina. Até 1917, cerca de 90 por cento da população que habitava a Palestina era árabe, mas em 1930 essa percentagem baixou para 80 por cento e no ano de 1936 a população judaica na Palestina já rondava os 40 por cento, contra os 60 por cento de outras origens. Os judeus compravam as terras aos árabes e foram aumentando a sua presença, tanto demograficamente como a nível da ocupação do território.
No período do Holocausto houve um grande contrabando de refugiados que iam parar na palestina, por outro lado vários judeus perpetravam actos de terrorismo contra as instituições britânicas no território. Assomando ao facto do Reino Unido estar a enfrentar os ataques da Alemanha nazista e a pressão para a independência da índia, levou a anunciar, no final de 1947, que no mês de Maio de 1948 devolveria a Palestina às Nações Unidas. A ONU, na altura com dois anos de existência, recomendou a divisão do território em duas partes: Uma para os árabes e outra para os judeus, mas os árabes não estavam receptivos a essa proposta.
No dia 14 de Maio de 1948 os Judeus proclamaram de forma unilateral a sua independência. Os árabes reagiram com ataques aos judeus, os países árabes envolveram-se directamente no conflito, mas os judeus que denominaram o seu território de Israel, em alusão aos tempos bíblicos da terra prometida, embora em desvantagem numérica, segundo as estatísticas de 1 para 40, conseguiram não só manter o território sob sua posse, como ocuparam outras regiões. No ano de 1949, o Egipto só controlava a região de Gaza e a Jordânia a Margem Oriental, a maior parte do território da então Palestina ficou sob tutela de Israel. É caso para dizer que era melhor que os árabes tivessem aceite a proposta de divisão do território feita pela ONU em 1947, através da resolução 181.
Como seria de esperar os árabes não ficaram conformados com a situação por várias razões. O fluxo de refugiados árabes não parava de aumentar saídos dos territórios ocupados, mas também porque os muçulmanos se sentiam humilhados, em função disso, os israelitas nunca tiveram paz, de dois em dois anos são obrigados a enfrentar um dos países vizinhos. Mas a guerra mais importante para a situação actual do conflito do Médio Oriente é a conhecida Guerra dos Seis dias que ocorreu em 1967. O Egipto, na altura governado por Nasser, fechou a navegação a Israel através do estreito de Tiran, mas todos os indícios levavam a crer que o Egipto preparava-se para uma guerra, tendo solicitado a retirada dos capacetes azuis do território que separava o Egipto de Israel.
O Egipto, a Síria e a Jordânia enviaram os referidos exércitos até a fronteira com Israel, perante a situação houve um contra-ataque de Israel. No fim da guerra Israel ocupou mais território, nomeadamente a Península do Sinai, a Faixa de Gaza; as Colinas Golan da Síria e a Margem Ocidental do Jordão.
A população pode ser significativamente aumentada através de incentivos para o aumento da natalidade. Mas conquistar território ou reaver envolve sempre tensões e até conflitos violentos. Isso acontece até entre os cidadãos e o Estado, temos assistido as tensões com as autoridades nacionais, em Angola, quando existe a necessidade de se implementar um projecto em zonas ocupadas pelas populações, ainda que elas estejam no local de forma ilegal. O mesmo está a acontecer no Médio Oriente, os perdedores da Guerra dos Seis dias, reclamam que a paz só poderá ser feita com base nas fronteiras que Israel tinha em 1967.
No dia 15 de Novembro de 1988, a Assembleia-Geral da ONU reconheceu, através da resolução 43/177, a proclamação do Estado Palestino feita pelo Conselho Nacional da Palestina e endossou o termo Palestina em subsituação ao termo OLP (Organização para a Libertação da Palestina) e, em Julho de 1998 com a resolução 52/250 a ONU reconheceu direitos adicionais à autoridade palestiniana como o direito de participar nos debates da Assembleia-Geral no inicio de cada sessão anual, o direito de replica, a co-autoria de resoluções e o direito de levantar pontos que ache relevantes na agenda com relação a situação na palestina e/ou no Médio Oriente.
A paz nunca foi alcançada porque dos dois lados há radicais. Todos lideres que tentaram uma flexibilização nas negociações foram mortes: Em 1977 o então Presidente egípcio Anuar Sadat foi a Israel e anunciou que o seu país estava disposto a negociar a paz de forma separada, tendo assinado os acordos de Camp David. Em 1981 Sadat foi assinado numa tribuna quando assistia um desfile militar; em 1982 o Presidente Libanês Bashir Gemayel foi assassinado depois de ter assinado um tratado de paz com Israel; Por outro lado, o Primeiro-ministro israelita Yitzhak Rabin também fez algumas concessões para alcançar a paz com os árabes, foi assassinado por extremistas judeus em Novembro de 1994.
A história de Israel continua com tensões com os países árabes, os ataques são constantes, em 2006 Israel evadiu o Líbano depois de ter sido alvo dos morteiros do Hezbollah. Em 2011 o Egipto sofreu baixas na Faixa de Gaza e a Turquia cortou relações diplomáticas com Israel na sequência do ataque israelita a embarcação turca na Faixa de Gaza em 2010.
A última crise entre Israel e os árabes e a entrega do pedido de aceitação da Palestina como Estado Membro da ONU com plenos direitos. Embora esse desejo já esteja condenado ao fracasso porque os EUA, um dos cinco membros permanentes do CS, já declararam que irão vetar. Mas o pedido poderá passar para Assembleia-Geral que pode reconhecer o Estatuto de Estado não membro desde que dois terços dos membros votem a favor. Esse facto pode estar garantido se todos os Estado membros da ONU votarem em consciência. Dos 193 estados membros da ONU, 109 reconhecem o Estado Palestino.
Um determinado Estado só é aceite como Estado membro da ONU se for aceite pelo Conselho de Segurança (CS) através da votação a favor de nove dos quinze estados membros do CS, inclusive os cinco membros permanentes. Portanto não há hipótese nenhuma da Palestina passar a membro da ONU com plenos direito a partir do dia 23 de Setembro de 2011. A União Europeia já manifestou as suas reticências, dois dos cinco membros do CS são membros da União Europeia, juntando os EUA o dossier está vetado. Assim o conflito árabe/israelita irá continuar, a expectativa é a de saber qual será o nível de intensidade depois do processo que está a decorrer na ONU.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

17 de Setembro dia do Herói Nacional em Angola

Aos Heróis da Nação

O mundo não é um dado, é algo buscado
E muitos lutaram para o presente vivido
Ultrajados e castigados perderam a juventude
Hoje colhem o fruto que semearam com atitude

Todos aclamamos com amor a nossa terra amada
Vivemos num país onde o nosso povo comanda
A liberdade se afigura na angustia da realidade
Mas graças à todos que lutaram com dignidade

Valorizar esses Homens não é nenhum favor
È um reconhecimento pela luta que fizeram com vigor!
Os monumentos para os heróis da nação deviam ser vivos
Suas façanhas contadas à todos para serem conhecidos

O herói nacional hoje é velho, mas já foi jovem valente
Serve de inspiração para a juventude consciente
Embora muitos não se lembram do seu passado
Foram eles que construíram o presente com muito fardo

Bem-haja à todos esses homens e mulheres
Que os seus actos sejam exaltados pelos cantores
E que a juventude seja precursora dessas conquistas
Para que a nossa soberania sobreviva às disputas

O herói preferiu a temeridade, superou a coragem
levava a esperança no peito como sua pagagem
abordou a morte com a propria vida mal vivida
Semeou a sorte cuja importância ninguém olvida

Belarmino Van-Dúnem

LIBÉRIA: DA GUERRA CIVIL A ELEIÇÃO DA PRIMEIRA PREISIDENTE EM ÁFRICA

Por: Belarmino Van-Dúnem
A Libéria é o Estado, no continente africano, que encarna o pan-africanismo. Os afro-americanos voltaram para o continente, no território que hoje constitui a Serra Leoa, na esperança de viver dias melhores, livres e com igualdade de direitos.
A história da actual Libéria começou em 1815 quando um comerciante norte-americano decidiu financiar alguns afro-americanos convicto de que esses teriam maior sucesso económico e social se estivessem instalados em África, terra dos seus ancestrais. O objectivo era o dar uma oportunidade aos negros americanos usufruírem também dos direitos fundamentais e refazerem a vida junto dos povos nativos, tentando transmitir os valores da liberdade e do bem-estar da Europa e dos EUA. Não foi preciso passar muito tempo para que afro-descendentes passassem a dominar politica e economicamente a região, passando a existir uma espécie de neocolonialismo feito por indivíduos da raça negra.
Os nativos viam os retornados e os seus descendentes como ocupadores do seu território. Desde a chegada da primeira leva de negros americanos, na primeira década do século XIX, envolveram-se em conflitos violentos, mas com vantagem para os novos habitantes que tinham o apoio da sua pátria de origem, os EUA. A pressão era muita para os ex-escravos negros americanos: por lado enfrentavam ataques frequentes dos grupos nativos, por outro, a coroa inglesa também via com maus olhos as tendências emancipadoras dos afro-americanos que, não tendo um território delimitado, poderiam influência toda a colónia, neste caso concreto a Serra Leoa.
As inquietações dos britânicos não demoraram muito a se efectivar, a administração americana declarou oficialmente a sua única colónia em África no ano de 1824, mas, três anos depois, ou seja, em 1827 os afro-americanos declararam a independência com base nos valores norte-americanos, facto que é facilmente observável pela semelhança das duas bandeiras. Alias, as autoridades americanas tiveram sempre uma atitude paternalista em relação aos liberianos que colocaram o nome de Monróvia a capital do país em homenagem ao Presidente norte-americano James Monroe (1817-1825), que apoiou a organização não governamental para angariação de fundos com vista a enviar afro-americanos para a actual Libéria. Inclusive o exército americano patrulhava e, fez várias intervenções no território para inibir as duas potências coloniais, Inglaterra na Serra Leoa e a França na Cote D’Ivoire, de fazerem qualquer tipo de intervenção na nova nação política neo-americana, constituída só por negros americanos, assim como para garantir a democracia interna.
Assim nasceu o segundo Estado africano independente, para alem da Etiópia que, apesar da ocupação Italiana, nunca sofreu com a colonização. Portanto, os liberianos emergiram no meio de paradoxos, uma guerra inevitável com os nativos devido a expansão constante do território, em menos de vinte anos o território duplicou. Os ingleses, que aceitaram a instalação da colónia americana a pensar na existência de um novo mercado, também viram as suas ambições goradas porque o Estado liberiana fazia toda a sua política voltada para os EUA. Mas o que mais impediu o desenvolvimento do território foram os conflitos internos que tomaram dimensões alarmantes.
O mais difícil de entender foi facto dos negros afro-americanos terem negado a cidadania aos nativos durante vários anos, os nativos só começaram a exercer o direito de voto, de forma limitada, em 1951 apesar de constituírem a maioria no país.
A democracia também era bastante deficiente, até 1980 só o Partido Republicano liberiano existia em competição com o Partido True Whing que dominou a política nacional até a década de 80. A partir dessa data começou o verdadeiro martírio do povo liberiano. No ano de 1980, pela primeira vez, chegou ao poder um liberiano de origem autóctone ou local. O Sargento, Samuel Doe orquestrou um golpe de Estado e instalou um regime militar no país até 1985 quando foram realizadas as primeiras eleições com a maioria nativa a votar sem qualquer restrição. Mas segundo a maioria das análises da altura, o processo esteve cheio de irregularidades e Samuel Doe foi declarado vencedor.
O regime instalado por Samuel Doe saiu de um extremo para outro. A minoria afro-americana foi afastada do poder, causando um grande descontentamento que levou ao início de uma escalada de violência com consequências para além das fronteiras da Libéria, nomeadamente na Serra Leoa. As facções de afro-americanos uniram-se para derrubar o regime de Samuel Doe.
O Grupo mais notável foi a Frente Nacional Patriótica da Libéria (FPNL, sigla inglesa) liderado por Charles Taylor, que subdividiu-se na facção que surgiu mais tarde com o nome de Frente Nacional Patriótica Independente da Libéria (IFPNL) com Prince Johnson na liderança, e foi essa facção que capturou e assassinou o Presidente Samuel Doe. A Guerra Civil da Libéria destacou-se em África por duas razões:
a) A crueldade usada pelos beligerantes era assustadora, tanto Samuel Doe como os grupos que o combatiam recorriam a violência de forma indiscriminada contra a população civil que julgavam estar do lado oposto. As milícias sob comando de Charles Taylor usavam caveiras humanas e incentivavam rituais com práticas de canibalismo a mistura, tal como reconheceu o próprio Charles Taylor numa das sessões do seu julgamento que está a decorrer em Haia. Justificou que essa pratica era feita pelos nativos e em algumas regiões de África desde os tempos antigos e que era uma das formas para valorizar as tradições africanas. Mas como é claro, esse argumento não foi bem recebido pelos juízes nem pelas pessoas comuns que estão a seguir o caso.
b) Foi na Libéria onde o continente africano, pela primeira vez, ensaiou uma intervenção militar comunitária. A CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) sentiu necessidade de criar estruturas de intervenção militar em 1990, ano em que a guerra civil se degenerou por todo país com consequências humanitárias bastante negativas e, sobretudo com extensão aos países limítrofes, devido ao grande fluxo de refugiados; desrespeito pelos direitos humanos; ataque as embaixadas e aos cidadãos estrangeiros e a existência de uma situação de anarquia no território liberiano. Os Chefes de Estado e de Governo da CEDEAO reuniram-se em sessão extraordinária na Gâmbia, Maio de 1990, para analisar a situação e tomar medidas adequadas. Dessa conferência saiu a Comissão de Mediação (SMC) e foi aprovado o “Plano de Paz para a Libéria” com os seguintes pontos:
• Observação do cessar-fogo imediato entre as facções
• Formação de um grupo de observação e monitorização da CEDEAO (ECOMOG)
• Realização de eleições legislativas e presidenciais em 1991
Em Julho de 1990, a Nigéria, Gana, Guiné, Serra Leoa e Gâmbia disponibilizaram militares para missão na Libéria. Essa missão de paz da ECOMOG foi a primeira que uma organização regional africana formava com uma força militar multinacional cuja finalidade era observar os acordos de paz num país africano.
Apesar do mandato da ECOMOG ter sido de Observação de Cessar-Fogo, os militares que compunham o grupo viram-se obrigados a combater com uma das facções em conflito, o NPFL liderada por Charles Taylor, que não concordava com o envio da força para o seu país, alegando falta de neutralidade das mesmas (Dowyaro 2000). Mas, segundo Robert A. Martimer (1996:191-195), a operação da ECOMOG na Libéria teve desde a sua génese grandes dificuldades porque não houve consenso entre os Estados membros. A divisão dos Estados membros, alguns apoiando os grupos rebeldes, enquanto outros apoiavam o regime no poder, fez com que as facções em conflitos não se entendessem. Segundo o mesmo autor, o grupo francófono da CEDEAO opôs-se desde o início ao envio das forças. Alguns Estados apoiavam materialmente e facilitavam a passagem dos rebeldes pelas suas fronteiras, a Cote D’Ivoire, por exemplo, facilitava as actividades do NPFL que prendia os capacetes azuis da ONU, assim como os efectivos da ECOMOG com inferior capacidade militar.
Os contornos que a missão da ECOMOG teve na Libéria permitem analisar dois aspectos fundamentais que uma missão de paz pode ter:
a) Por um lado, os aspectos negativos que uma missão deste carácter pode ter se a sua preparação não for feita com todos os pressuposto humanos, materiais e políticos;
b) Por outro lado, permite analisar as vantagens que uma força de mediação, prevenção e resolução de conflitos a nível regional tem. Embora os mesmos erros tenham sido repetidos por outras organizações regionais e pela União Africana nas missões que se seguiram no continente.
Depois da assinatura de vários acordos de paz, só em 1996 é que os cidadãos viveram numa paz precária e pela primeira vez uma mulher assumiu os destinos de uma Nação africana. Ruth Perry, presidiu o Conselho Nacional da Libéria que levou o país até as eleições em 1997 que colocaram Charles Taylor na Presidência com 75 por centos dos votos. Mas a guerra civil só terminou em 2003 quando o empresário Gyude Bryant foi indicado como Presidente interino para a realização de eleições, numa altura em que o Presidente eleito, Charles Taylor já se encontrava foragido. As eleições foram realizadas em 2005 e, mais uma vez, a Libéria elegeu a primeira mulher Presidente, Ellen Johonson-Sirleaf.
Embora não seja de origem afro-americana é considerada como tal. Aliás foi Ministra das finanças durante a presidência de William Tolbert, mas durante alguns meses exerceu também o cargo de Presidente do Banco de Desenvolvimento e Investimento no governo formado por Samuel Doe depois do Golpe de Estado. No mês de Outubro de 2011, Ellen Johonson irá tentar renovar o mandato como já anunciou, contrariando a promessa que fez em 2005 de não recandidatar-se. A verdade é que até a data o país está em paz e a trilhar os caminhos do desenvolvimento social e económico o que prova que a guerra só traz desgraças.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Terrorismo: 11 de Setembro de 2011

Terrorismo: 11 de Setembros de 2011
O terror afectou a cidadania das pessoas
Jornalista: Eleazar Van-Dúnem

fotos: Mota Ambrósio
ANALISTA POLÍTICO BELARMINO VAN-DÚNEMDocente universitário fala do terrorismo dez anos após o onze de Setembro
In: Jornal de Angola 11/09/2011
Há dez anos, o mundo assistiu em directo, perplexo, à queda das torres gémeas do World Trade Center, símbolo oponente da então robusta economia dos Estados Unidos, através do maior ataque terrorista já perpetrado no mundo, que atingiu o coração do país mais poderoso do planeta. Uma década, depois, morto o mentor dos atentados, Osama Bin Laden, e fragilizada a organização que orquestrou a operação, Al Qaeda, ainda persistem incógnitas sobre o terrorismo e o futuro do fenómeno.
O analista político e docente universitário Belarmino Van-Dúnem fala ao Jornal de Angola sobre o que mudou passados dez anos após os ataques de 11 de Setembro de 2001, que provocaram a morte de mais de 3 mil pessoas em território americano.
Jornal de Angola - Como o 11 de Setembro de 2001 mudou a consciência do mundo quanto ao terror?
Belarmino Van-Dúnem
- O 11 de Setembro foi resultado de um conjunto de situações acumuladas ao longo do tempo e culminaram com os actos que levaram à destruição das torres gémeas do World Trade Center.
Este acontecimento marcou a história da humanidade porque atingiu o coração das democracias ocidentais e provocou uma viragem na concepção das relações internacionais.
Pela primeira vez a maior potência mundial foi ferida no seu próprio território e os Estados Unidos adoptaram uma política de tendência unilateralista.
O conceito de inimigo transformou-se para cada indivíduo e os níveis de segurança aumentaram com medidas que coartaram alguns direitos de cidadania,com destaque para as liberdades fundamentais conquistas ao longo dos séculos.
Os ataques do dia 11 de Setembro demonstraram que qualquer país está vulnerável ao terrorismo e ao radicalismo religioso, esse facto transformou-nos a todos em potenciais terroristas a luz da segurança do Estado.
JA -Até que ponto a efeméride mudou o conceito de terrorismo?
BV -
Os actos terroristas passaram a ter novas motivações e o terrorismo passou a variar entre os ataques à cidadania e aos símbolos estratégicos de uma determinada civilização ou nação. O terrorismo internacional se descentralizou e criou um sistema em que não se sabe o centro do qual emana a ordem para uma determinada acção e os ataques suicidas criaram um novo conceito de segurança, as pessoas em si também passaram a ser bombas. O terror afecta a cidadania das pessoas no que de mais básico existe.
JA -Houve exageros na resposta ao 11 de Setembro?
BV
- Em muitos casos houve decisões isoladas por parte dos Estados Unidos. Por exemplo, o país decidiu intervir no Iraque e só depois convidou outros Estados da OTAN, quando devia ser uma decisão de consenso.
Existem excessos na segurança dos aeroportos e acções reprováveis são aplicadas de qualquer forma contra tudo e todos.
A própria morte de Bin Laden abriu uma fissura nas relações entre Washington e Islamabad e em alguns casos o radicalismo é combatido com meios e atitudes radicais semelhantes aos actos que se estão a combater, como vê é um paradoxo combater o terrorismo com terrorismo de Estado.
JA -A morte de Bin Laden enfraqueceu o terrorismo?
BV
- Foi um marco importante na história da luta contra o terrorismo. O líder da Al Qaeda era o rosto do terrorismo internacional, um símbolo vivo e uma inspiração para alguns seguidores praticarem certos actos.
A morte de Bin Laden tem uma abrangência simbólica profunda e demonstra a impossibilidade de se cometer crimes e ficar impune, por outro lado mostra que o caminho para se promover uma ideologia religiosa ou política não pode ser através da violência.
JA - Até que ponto a “islamofobia” prejudicou o Islão?
BV
- O 11 de Setembro trouxe a percepção errada e negativa de que os praticantes do Islão são potenciais radicais e terroristas, prejudicando grandemente a religião islâmica. O Islão era a religião que mais crescia no mundo, mas desde os ataques as Torres Gémeas houve um declínio significativo, alguns Estados até vêem o islão como um perigo para a segurança nacional.
A própria América era terreno fértil para o islamismo, algumas celebridades americanas dos anos 70 e 80 do século passado como Malcolm X, Mohammed Ali, entre outras, converteram-se ao Islão, que era símbolo de liberdade, solidariedade e pureza. Toda essa visão desapareceu com o 11 de Setembro.
JA – Como se pode mudar essa percepção?
BV
- As pessoas devem lembrar-se que já havia terrorismo antes do 11 de Setembro e que a própria Al Qaeda já existia e cometia actos terroristas. É preciso consciencializar as pessoas que ser muçulmano não é ser terrorista.
Os líderes religiosos islâmicos devem fazer esse trabalho junto dos seus fiéis e da comunidade internacional porque o Islão tem sido conotado com o terrorismo internacional.
JA - O atentado terrorista de Oslo muda esse paradigma?
BV
- Este atentado foi cometido por um cristão e comprova que o radicalismo e o terrorismo podem vir de todas as partes. O ataque demonstra que o combate deve ser contra todo tipo de radicalismos e de actos terroristas e não especificamente contra uma religião.
JA - Porquê que os países desenvolvidos têm mais medo do terrorismo?
BV
- Porque apesar dos chamados Estados fracos serem mais propensos aos ataques terroristas, os alvos escolhidos estão maioritariamente nos países são ocidentais ou são do seu interesse.
O objectivo é sempre ferir os países do Ocidente, o capitalismo, os globalizadores, mas como existem mais dificuldades em perpetrar esses actos nos países ocidentais, os radicais acabam por atingir interesses desses países nos Estados mais vulneráveis.
As embaixadas, empresas multinacionais, interesses económicos e outros símbolos dos países mais desenvolvidos são os alvos principais dos grupos terroristas.
JA - Que insuficiências nota na luta contra o terror?
BV
- Insuficiências do ponto de vista social. Alguns actos praticados por cidadãos identificados e por acções cujas finalidades e pressupostos são perfeitamente conhecidos, todos nós nos transformámos em potenciais terroristas.
É necessário procurar outras estratégias que permitam repor a normalidade do relacionamento entre as pessoas e entre as comunidades entre si.
Por outro lado, é necessário mais trabalho e consenso para se encontrar uma solução para o terrorismo internacional descentralizado, que criou um sistema em que não se sabe quem manda e qual a forma de coordenação. Os excessos com torturas, prisões arbitrarias, violação das soberanias, invasão da privacidade, limitações nos movimentos de bens e pessoas, tudo em nome da luta contra o terrorismo, mas pessoas desejam muito mais coisas para alem da segurança, a liberdade por exemplo.
JA - E quais são os ganhos?
BV -
Algumas medidas foram eficazes e eficientes do ponto de vista de organização do Estado, da troca de informações, e da estrutura da comunidade internacional no combate ao terrorismo. A Al Qaeda foi desgastada, o que culminou na morte de Osama Bin Laden. Hoje qualquer Estado é subscritor de protocolos contra o terrorismo internacional.
JA - A diminuição do fenómeno passa pela democratização dos países árabes?
BV
- A implantação menos cuidada da democracia não diminui o fenómeno do terrorismo internacional. Quando a democracia é forjada, a probabilidade de grupos radicais chegarem ao poder e formarem governos que favoreçam o terrorismo é muito maior. Por outro lado, quanto menos cuidadas são as transições democráticas nos países árabes, onde os grupos radicais estão bem enraizados, maior é a possibilidade desses grupos assumirem o poder porque têm maior aderência popular. Portanto me parece que o caminho não é a democratização desses países, sob pena da própria democracia cair no descrédito como acontece em alguns Estados onde os países ocidentais retiram governos democraticamente eleitos por ser formados por partidos com pendor islâmico.
JA - Isto não é um paradoxo?
BV
- É curioso. Na maior parte dos países árabes em que houve eleições livres e justas, grupos de pendor islâmico com algum radicalismo acabaram por ganhar as eleições, o que tem trazido problemas e mais complexidade na relação desses governos com os países ocidentais.
O paradoxo existe no comportamento dos países ocidentais, que não conseguem conciliar o discurso de expansão da democracia e de defesa de sociedades mais abertas e pluralistas com os países de pendor islâmico, porque sabem que nesses casos os grupos islâmicos acabam por vencer as eleições. Ai a democracia deixa de ser democrática.
JA - A questão da formação de um Estado palestiniano pode reduzir o terrorismo?
BV
- A solução da questão palestiniana pode contribuir para a diminuição dos perigos que o terrorismo internacional apresenta actualmente.
O mundo árabe anda agastado com a questão da palestina e com o facto de Israel ter apoio quase incondicional dos Estados Unidos da América e de alguns países ocidentais, que fazem uma espécie de tampão e pressão para que se mantenha o “status quo” da Palestina.
Um Estado palestiniano pode ser factor de moderação do terrorismo porque muitos destes grupos apontam ou vêm a questão palestiniana como exemplo de dominação e de opressão por parte dos países ocidentais quando os seus interesses estão em causa.
A existência de um Estado palestiniano, a cooperação e o tratamento de igualdade e respeito mútuo entre Israel e os países árabes pode diminuir a existência de actos terroristas e de muitos grupos radicais.
JA - Até que ponto a situação na Líbia pode influenciar o terrorismo?
BV
- A possibilidade da Líbia se desestabilizar e tornar-se num segundo Iraque ou Afeganistão pode aumentar o terrorismo internacional.
O país tem uma extensão territorial considerável e regiões praticamente inacessíveis, podendo tornar-se num covil de recrutamento de radicais e de terrorismo, como aconteceu nesses dois países.
A OTAN e os países que estão a intervir na Líbia devem tomar medidas para que isso não aconteça, mas neste momento estão preocupados com as questões económicas. A Líbia do amanha é uma incógnita, os líderes do CNT foram principais colaboradores do Kadafi, mas do dia para a noite foram transformados em salvadores do país.
JA -Todos os meios são válidos para acabar com o terror?
BV
- Não concordo com os atropelos aos direitos humanos, com o terrorismo de Estado, com a imposição de medidas aos chamados Estados fracos e com a violação da soberania e ingerência aos assuntos internos de outros países com a desculpas de estar a combater o terrorismo.
JA -Qual é a fórmula para a diminuição do fenómeno?
BV
- É um trabalho estruturado de educação, de formação, de cooperação e de desenvolvimento, para que as pessoas estejam preparadas para a democracia multipartidária, pluralista e com rotatividade no poder, onde qualquer grupo organizado e constitucionalmente reconhecido possa chegar ao poder.
Também é fundamental criar parcerias com Estados cooperantes e uma interdependência entre os Estados na luta contra o terrorismo. Não se pode promover o “seguidismo” ou obrigar os Estados a seguir determinadas estratégicas. Os Estados são soberanos e devem ter políticas próprias e ser respeitados como parceiros.
Penso que é através da moderação, da cooperação, da compreensão e da flexibilidade activa que devemos combater o terrorismo internacional.
JA -O que Angola tem feito para prevenir o fenómeno?
BV
- Angola subscreveu algumas Acordos internacionais e regionais contra o terrorismo internacional e tem criado estruturas que permitem o combate contra o terrorismo.
É necessário que o país crie estruturas políticas, sociais e de segurança que impeçam a emergência desses grupos e possibilitem aos cidadãos terem a visão e liberdade de interagir neste mundo globalizado.
Penso que Angola tem todas as condições para evitar que esses grupos se implantem e se enraízem no país, e que exista grupos radicais internos.
JA -Qual é o futuro do terrorismo?
BV
- Vai depender. Qualquer cidadão precisa e tem o desejo de segurança, portanto deve colaborar para que a segurança internacional seja uma realidade, mas se continuarem com acções unilaterais, se a disparidade entre ricos e pobres aumentar, se os Estados ocidentais continuarem a primar pelo intervencionismo em nome dos seus interesses económicos como está a acontecer em alguns países da África do norte e se os mecanismos de imposição de determinadas condutas prevalecerem não tenho dúvidas que os grupos terroristas vão emergir e que o radicalismo vai continuar.